Livro do mês: Unidos do Outro Mundo - Boni

Mais uma seção estreando no Diário, dessa vez para abordar os livros que estou lendo. Como não consigo atualizar o blog na periodicidade que deveria, Livro do mês é o título ideal: pelo menos mensalmente, farei uma resenha breve de um título lido recentemente. 

Para começar, uma obra que acabei hoje, presente de aniversário - completei 25 anos no último dia 25. Unidos do Outro Mundo - Dialogando com os Mortos, do Boni (Ed. Sextante, 288 páginas), lançado em dezembro do ano passado.

José Bonifácio de Oliveira Sobrinho - o Boni - estreou na literatura em 2011, com sua autobiografia televisiva: O Livro do Boni - que tenho, mas ainda não li. Na obra, o publicitário, empresário e ex-diretor da TV Globo relata sua trajetória na televisão, desde os primórdios na Tupi até se tornar o "Todo Poderoso", seu apelido na emissora dos Marinho.

Ao completar 80 anos, em novembro de 2015, Boni resolveu lançar Unidos do Outro Mundo, uma espécie de "memórias póstumas" de autor vivo, em que relata como seria sua Reconexão com amigos, colegas e familiares no lado de lá da vida.

O resultado é um livro leve, divertido e até emocionante, principalmente nas passagens em que Boni se reencontra com os pais e a avó Nicota, que ele não conseguiu chegar a tempo de ver antes de morrer. Leitura rápida, as 288 páginas fluem bem - além das ilustrações que não poderiam faltar numa obra que aborda, majoritariamente, a televisão brasileira e os profissionais que a construíram. É o típico livro que dá para "ler numa sentada"...

Entre as figuras famosas, amigas e colegas que Boni reencontra após sua "morte" num acidente de carro, após um bueiro estourar numa avenida do Rio de Janeiro, estão os mestres da teledramaturgia Cassiano Gabus Mendes, Dias Gomes e Janete Clair; o grande Manuel de Nóbrega, da Praça da Alegria; Dercy Gonçalves, Chacrinha e Joãozinho Trinta; os inesquecíveis Paulo Gracindo e Chico Anysio; os geniais Tom Jobim, Vinícius, Miele e Bôscoli; e figuras de destaque na Globo como Armando Nogueira, Carlos Manga, Roberto Talma, Marcos Paulo e Walter Avancini.

Também não ficaram de fora o acerto de contas com Walter Clark, desafeto de Boni após sua demissão da Globo, e o patrão Roberto Marinho. A exemplo de Dante na Divina Comédia, Boni é "guiado" em sua Reconexão pelo amigo João Araújo, fundador da Som Livre e pai de Cazuza.

Apesar de não entrar em polêmicas, o texto de Boni dá agulhadas pontuais em aspectos que o desagradam no panorama atual brasileiro, tanto na televisão quanto na música, futebol e política. Assim, não é de se estranhar que, em suas versões fictícias e espirituais, figuras como Dias Gomes e o próprio Roberto Marinho digam que "querem voltar" para dar um jeito no que está aí.

Aliás, o diálogo entre Dias Gomes, Janete Clair e Boni sobre as novelas atuais - da Globo e da concorrência - é um capítulo imperdível e elucidativo sobre os rumos que nossa teledramaturgia está tomando. Em resumo, o casal "reforça" a ideia de que o excesso de favelas, vilanização dos personagens e o fim das tramas clássicas estão acarretando a derrocada da audiência das novelas. Nada é falado sobre as novas plataformas, em todo caso...

Com a esposa Lou, o filho Boninho, a nora Ana Furtado e a neta no lançamento do livro

Um ponto em que é preciso tirar o chapéu para o autor: no alto de seus 80 anos, o ex-Todo Poderoso global reconhece muitos de seus erros e faltas ao longo da carreira, em especial com Dercy Gonçalves - responsável por alavancar o ibope da Globo em seus primórdios, e renegada pela emissora em sua busca pelo "padrão de qualidade" que se tornou marca registrada.

Para quem busca reflexões religiosas ou espirituais, porém, não espere grandes coisas: agnóstico, Boni comenta vez ou outra sobre conceitos como reencarnação, vida eterna, céu e inferno, mas sem entrar nos méritos.

Para os comunicadores e espectadores, Unidos do Outro Mundo é uma leitura bacana, uma espécie de resumo das relações entre uma figura chave da TV brasileira e aqueles que o cercaram em décadas de atuação.