domingo, 9 de agosto de 2015

O Rei do Gado: as razões do sucesso atemporal de Benedito Ruy Barbosa

Exibida entre 1996 e 1997, e reexibida por duas vezes nos anos subsequentes (a mais recente em 2011, no canal Viva), O Rei do Gado permanece um sucesso de audiência mesmo duas décadas depois.
Com capítulos encurtados para durarem mais tempo no ar (de janeiro a agosto, um marco na Vale a Pena Ver de Novo), a trama de Benedito Ruy Barbosa emplacou nada menos que média de 17 pontos de ibope, marca que atinge e supera índices da faixa das 18h e 19h. E que, entre outros fatores, deu sobrevida à temporada 2015 da interminável Malhação. É mole ou quer mais?


Em tempos de crise de Babilônia e novos gostos do telespectador, o que a trama dos Berdinazzi e Mezenga tem a nos ensinar?




Saga rural e identificação com o público


Por mais que o Brasil tenha se urbanizado, nossas raízes são essencialmente rurais. A maioria das pessoas tem um antepassado que veio "da roça", oriundo de gerações de brasileiros (índios, negros e portugueses) ou descendente de imigrantes que também "pegaram na enxada" para vencer na vida. 
O Rei do Gado levou isso ao ar em sua plenitude: além de ser uma trama sobre Bruno Mezenga (Antonio Fagundes), latifundiário e personagem-título, e seu amor pela boia-fria Luana (Patricia Pillar), a primeira fase trouxe ao público a nostalgia das famílias italianas, suas disputas, amores, ódios e guerra. Um "Romeu e Julieta rural e carcamano", por assim dizer.

A guerra, no caso, foi a "maledetta" de 1939 a 45, retratada na história a partir do pracinha brasileiro, filho de italianos, Bruno Berdinazzi (Marcelo Anthony, em seu primeiro papel) que foi servir na campanha da FEB na Itália e acabou morto como herói.

Aliás, se editada como minissérie ou até mesmo filme, a primeira fase de O Rei do Gado não faria feio em festival nenhum. Elenco excelente em cena, texto e direção primorosos fazem do início da saga dos Berdinazzi e Mezenga um clássico atemporal.
Em entrevista para o UOL, em fevereiro, sobre o sucesso da terceira reprise, o diretor Luiz Fernando Carvalho sintetizou as razões de tamanho sucesso. "Lamento que enredos e universos como os desta novela tenham se tornado tão raros na televisão. Benedito, juntamente com Dias Gomes, talvez sejam os autores que mais se voltaram para o Brasil profundo, o mundo rural e seus desdobramentos sociais. Sem falar de uma certa atmosfera de saga que suas histórias sempre cultivaram".

Reforma agrária, Regino e senador Caxias

Outro fator de suma importância para entender o fenômeno O Rei do Gado é a questão da reforma agrária, discutida a partir do núcleo do líder sem-terra Regino (Jackson Antunes) e do incorruptível senador Caxias (Carlos Vereza, em atuação antológica).
A morte do senador Caxias: uma das cenas mais tristes de O Rei do Gado
Benedito é famoso por abordar questões rurais desde suas primeiras novelas, como a também memorável Os Imigrantes (1981-82), da Band. A também bem sucedida Terra Nostra (1999) foi outro folhetim que trouxe histórias de italianos e outras etnias no horário nobre, contando ainda com a atuação do saudoso Raul Cortez, em personagem inspirado no histórico Conde Matarazzo.

Mas em relação aos sem-terra e sua luta por um pedaço de chão para plantar e viver, a trama ganhou contornos políticos bastante progressistas para a época. Se em 1996 isso já soava tabu no debate político, em 2015, infelizmente, o forte lobby da bancada ruralista ainda não permitiu que a divisão igualitária de terras avance no país.

Regino e Caxias, icônicos personagens que se tornaram, ficaram ainda mais marcados na memória do público por seu final trágico: ambos morreram por seus ideais. Se por um lado ficamos tristes pelo desfecho, por outro é compreensível no plano da narrativa: quando um personagem supera patamares e se torna um símbolo, a morte é inevitável para eternizá-lo dessa maneira. Que o diga o caso recente da morte do Comendador (Alexandre Nero) em Império...

O que vem por ai na faixa das 21h


O próximo folhetim da Globo vai continuar fora da temática agrícola. A Regra do Jogo, de João Emanuel Carneiro, que começa daqui a três semanas - já antecipamos um pouco sobre a novela no Diário - terá como cenário principal uma favela carioca. 

Na sequência, Sagrada Família, de Maria Adelaide Amaral (sua linda!) e Vincent Villari, vai se passar numa cidade do interior paulista. Já no começo de 2017, Gloria Perez voltará a ocupar o horário nobre, com temática ainda não revelada (medo de um novo Salve Jorge).
Benedito Ruy Barbosa, 84 anos, afastado das 21h desde o fiasco Esperança (2002), sonha em emplacar um novelão no estilo Pantanal (1990), produção que marcou época na extinta TV Manchete. Com a ótima repercussão de ibope de O Rei do Gado, aumentam as chances de o veterano novelista ter seu projeto aprovado pelo Plim-Plim.

A vaga, porém, será disputada no cronograma com a dupla de novelistas Duca Rachid e Thelma Guedes, responsável por sucessos das 18h como Cordel Encantado e Joia Rara. As autoras já começaram a escrever uma trama de suspense ambientada em São Paulo, também para às 21h. 

Vale lembrar que, antes disso, Benedito estará no ar com Velho Chico, novela rural prevista para estrear em meados do ano que vem, às 18h (Fonte: Terra).

Para quem não se lembra, o autor e suas filhas Edmara e Edilene também são os responsáveis pelos remakes de sucesso Cabocla (2004), Sinhá Moça (2006) e Paraíso (2009). Já Meu Pedacinho de Chão (2014), a arrojada novelinha das 18h - também em parceria com Carvalho - não foi bem recebida pelo ibope. É preciso inovar, mas com cautela para não causar estranheza.

E para finalizar esse post-homenagem, a trilha sonora (outro marco da novela) da Orquestra da Terra. Para ver e rever sempre!

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